Depois de anos na mesma rotina, sentia-se até orgulhoso em chamar-se aposentado. Lembrava com glória de todos os seus anos em serviço, porém já preferia este seu novo modo de vida, tranquilo, com tarde inteiras gastas no café da rua debaixo. Fora lá que tomara seu cappuccino de aposentado, acompanhado de broinhas de milho, pela primeira vez, e pela segunda, e pela terceira. Começou como esse passatempo, evoluiu para hábito. O cozinheiro já até o chamava pelo primeiro nome.
E foi lá pela terceira ou quarta semana da vida nova em que, experimentando sentar-se na calçada ao invés de no balcão, viu-a passar. Não era a primeira moça em quem reparava naquela tarde, já que, sentado tão perto do barulho, não conseguia ler, e precisou achar outro passatempo enquanto tomava seu café. Viu moças bonitas, feias, encontrou algumas conhecidas com quem chegou até trocar uma palavra ou duas, e ela – meu Deus, quem era ela? Parecia tão distraída, caminhando na calçada como se vindo na sua direção – será? – moderna e casual. Parou ao lado de sua mesa, apertando os olhos para ler quais eram os pratos do dia. Tinha olhos azuis, talvez. E cabelo moreno, claro, quase loiro. O velho aposentado a encarava, com a boca aberta, segurando uma broinha no ar. Preparara-se para mordê-la, mas distraiu-se tanto que acabou por se esquecer. E assim ficou, como uma estátua abobada enquanto ela ainda decidia se entraria ou não.
Afinal decidiu que não, e virou-se para atravessar a rua. Em algum momento durante este processo, a tal broinha caiu da mão do velho e, rolando, seguiu a moça até bater em seu pé. Com um impressionante desdém, ela olhou para baixo e, identificando a broinha, virou-se para o velho com apenas um sorriso simpático. Ele ainda se encontrava naquela mesma pose boquiaberta que, agora sem a broa, tornava-se um pouquinho mais boba. Respondeu-lhe também com um sorriso, vergonha misturada com charme, mas a reação foi-lhe tão demorada que nem sabe se ela a viu. Já atravessava a rua, cabelos avermelhados ao vento.
Mal posso lhe contar qual sensação foi aquela que dominou nosso amigo aposentado que, tão maravilhado estava com aquele novo acontecimento, nem se ressentiu pela broinha desperdiçada. Foram pouquíssimos segundos, pensava, mas que parecem uma eternidade e meia. Estava maravilhado. E tão ousado que até pediu uma pedaço daquele bolo de chocolate que ainda não havia provado. Será que ela voltará amanhã?, sonhava durante sua caminhada de volta para casa, será? Se sim, puxarei papo, simpático e cordial e... Assim formulou em sua cabeça toda a cena que se seguiria no dia seguinte, se ela aparecesse de novo.
Infelizmente, porém obviamente, ela não voltou. Nem no dia seguinte, nem nos outros ainda. Não que ele já tenha desistido de esperar. Viciou-se de vez. Não há mais manhã em que não acorde pensando nos passos que dará à tarde até o café. O cozinheiro já até deixa o seu pedido pronto, pois sabe que lá pelas três horas da tarde, o aposentado irá chegar e sentar-se em qualquer uma das mesas da calçada, confortar-se na cadeira de madeira, ajeitar a gravata, arrumar o cabelo de acordo com o vento, abrir um livro e encarar impiedosamente a rua, esperando aquela moça passar de novo.
E foi lá pela terceira ou quarta semana da vida nova em que, experimentando sentar-se na calçada ao invés de no balcão, viu-a passar. Não era a primeira moça em quem reparava naquela tarde, já que, sentado tão perto do barulho, não conseguia ler, e precisou achar outro passatempo enquanto tomava seu café. Viu moças bonitas, feias, encontrou algumas conhecidas com quem chegou até trocar uma palavra ou duas, e ela – meu Deus, quem era ela? Parecia tão distraída, caminhando na calçada como se vindo na sua direção – será? – moderna e casual. Parou ao lado de sua mesa, apertando os olhos para ler quais eram os pratos do dia. Tinha olhos azuis, talvez. E cabelo moreno, claro, quase loiro. O velho aposentado a encarava, com a boca aberta, segurando uma broinha no ar. Preparara-se para mordê-la, mas distraiu-se tanto que acabou por se esquecer. E assim ficou, como uma estátua abobada enquanto ela ainda decidia se entraria ou não.
Afinal decidiu que não, e virou-se para atravessar a rua. Em algum momento durante este processo, a tal broinha caiu da mão do velho e, rolando, seguiu a moça até bater em seu pé. Com um impressionante desdém, ela olhou para baixo e, identificando a broinha, virou-se para o velho com apenas um sorriso simpático. Ele ainda se encontrava naquela mesma pose boquiaberta que, agora sem a broa, tornava-se um pouquinho mais boba. Respondeu-lhe também com um sorriso, vergonha misturada com charme, mas a reação foi-lhe tão demorada que nem sabe se ela a viu. Já atravessava a rua, cabelos avermelhados ao vento.
Mal posso lhe contar qual sensação foi aquela que dominou nosso amigo aposentado que, tão maravilhado estava com aquele novo acontecimento, nem se ressentiu pela broinha desperdiçada. Foram pouquíssimos segundos, pensava, mas que parecem uma eternidade e meia. Estava maravilhado. E tão ousado que até pediu uma pedaço daquele bolo de chocolate que ainda não havia provado. Será que ela voltará amanhã?, sonhava durante sua caminhada de volta para casa, será? Se sim, puxarei papo, simpático e cordial e... Assim formulou em sua cabeça toda a cena que se seguiria no dia seguinte, se ela aparecesse de novo.
Infelizmente, porém obviamente, ela não voltou. Nem no dia seguinte, nem nos outros ainda. Não que ele já tenha desistido de esperar. Viciou-se de vez. Não há mais manhã em que não acorde pensando nos passos que dará à tarde até o café. O cozinheiro já até deixa o seu pedido pronto, pois sabe que lá pelas três horas da tarde, o aposentado irá chegar e sentar-se em qualquer uma das mesas da calçada, confortar-se na cadeira de madeira, ajeitar a gravata, arrumar o cabelo de acordo com o vento, abrir um livro e encarar impiedosamente a rua, esperando aquela moça passar de novo.
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"Quando alguém pergunta a um autor o que este quis dizer, é porque um deles é burro"
Mário Quintana