sexta-feira, 14 de novembro de 2008

A adolescente e a sua mãe

Era o mesmo aperto no peito que ela sentira muitas vezes antes. Vinha como uma avalanche discreta que a impedia de pensar ou agir. Isso deve explicar a sua dificuldade em abrir a porta. Já não conseguia segurar o choro com tanta segurança e sentiu um grande alívio quando a chave se virou na fechadura. Seus joelhos doíam e sentia um grande cansaço, mas acima de tudo, seu coração parecia não mais agüentar todo aquele desespero. Entrou esbaforida na casa, jogou sua bolsa na poltrona mais próxima e sentou-se no sofá. As lágrimas finalmente começavam a cair pesadas e magoadas, mas que iam vagarosamente aliviando o desespero antes sentido. Ela sabia que estaria sozinha. Sabia que quando voltasse de sua aula, tudo estaria exatamente no lugar onde foram deixadas. Isso fazia com que suas lágrimas caíssem ainda mais magoadas. Quinze minutos depois ela já estava no banho, com as cicatrizes daquele desespero se escondendo - elas nunca se curavam. Até hoje, algumas continuam abertas, mas não doem contanto que estejam esquecidas na memória. Muitas horas depois a sua mãe chegou, acompanhada do resto de sua família. A adolescente sorria com a alegria de uma criança diante o Natal. Era um dos sorrisos mais sinceros. Talvez a segurança e o alívio de finalmente tê-la por perto faziam com que a sinceridade ficasse ainda mais clara. A expressão de sua mãe era de cansaço. Estava faminta, sua cabeça e suas costas doíam por causa da bagagem pesada. A viagem tinha sido longa demais – agora ela só queria dormir. Sentindo a pura ansiedade, carente como sempre, a adolescente falava nervosamente com a vontade de conversar com a sua mãe, recuperando o tempo perdido. Sabia que a sua mãe não estava interessada naquilo, mas sentia que precisava contar tudo com todos os detalhes, só para poder continuar a fingir que a sua mãe sempre esteve ali.


Com sorrisos e piscadas a mãe ouvia tudo, porém um pouco distraída. Mostrava em seu rosto que tentava se importar com a urgência das fofocas, mas ainda assim, só queria dormir.


Já um tanto sem fôlego e finalmente quieta, a adolescente observava enquanto a sua mãe comia - sabia o que viria a seguir. Sabia que depois que a sua mãe terminasse, elas se abraçariam por um bom tempo, e que depois iriam dormir. Também sabia que ia demorar um pouco até cair no sono, e que de manhã teria que acordar cedo e sozinha, já que a sua mãe não ouviria o despertador.


Isso fazia com que aquele desespero inicial voltasse talvez um pouco mais sutil, mas ainda devastador, e então ela tentaria adiar o máximo possível a hora de dormir, só para poder ficar mais tempo com a sua mãe, só para conseguir diminuir o tempo que ficaria acordada e sozinha no escuro. E para isso, ela recomeçou a falar.
Mas a sua mãe já estava cansada demais para fingir que se interessava. Para fazer com que a adolescente parasse de falar de vez, abraçou-a muito mais forte do que de costume, deu-lhe um beijo na bochecha e jurou amor eterno.


Este abraço bastou para que todo o desespero e angustia sumissem, e então a adolescente conseguiu dormir com a confiança de quem sabe que o amor é indestrutível.

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"Quando alguém pergunta a um autor o que este quis dizer, é porque um deles é burro"
Mário Quintana