sábado, 19 de julho de 2008

O homem que tinha medo de peixes

Havia um homem que tinha medo de peixes. Seu nome era Tag. Tag não sabia por que tinha medo de peixes. A sua cor indescritível, sua textura nojenta, seus olhos vermelhos de peixe morto - assim como seus olhos arregalados de peixe vivo - ou o seu horrível, horrível cheiro eram apenas pontos bônus na sua lista de "coisas assustadoras".
Tag não tinha amigos, inimigos ou namorada. Sua família - só - não se importava o bastante. Trabalhava na biblioteca local, mas estava pensando em se demitir - ele não gostava de sua chefe, " aquela mulher ridícula, que não sabe nem passar batom!"
Tag era um cara solitário.
Mas na sua casa grande demais para apenas uma pessoa, tinha um gato gordo, ruivo e cego de um olho. O seu nome era Hamster. Oh! Tag realmente amava Hamster! Ele o encontrou um dia, voltando do mercado. Ele estava perdido e sozinho. Foi amor a primeira vista, quer dizer, Tag amou o gato, e o gato amou a garrafa de leite que Tag estava carregando. (E se por acaso você está se perguntando, Tag pensou sim em comprar um hamster de verdade - bem antes dele conhecer Hamster, o gato - ou até mesmo um coelho, mas aquela coisa da gaiola o assustou um pouquinho, afinal, "o que é uma gaiola se não um aquário com buracos?".) Hamster, o gato, realmente achava que era uma hamster, o rato, e adorava correr na rodinha que Tag construiu para ele.
Tag era um cara diferente.
O cabelo de Tag combinava com o pelo de seu gato. Seus dentes, pés e nariz eram grandes demais para o seu corpo magrinho. A pele de seu rosto era coberta de espinhas grandes e vermelhas.
Tag era um cara estranho.
Quando Tag viu um peixe pela primeira vez na sua vida, tinha quatro anos. Ele chorou, ele gritou, ele ficou vermelho e ele desmaiou. Já na segunda tinha quase sete anos e ele chorou e ele gritou. Ele gritou até os seus pulmões desistirem de funcionar. Na terceira ele tinha nove anos, e ele gritou muito. Um grito doentio. Mas agora ele não gritava mais. Ou chorava. Ele só desmaiava. O que era bem mais silencioso.
Tag era um cara problemático.
Mas Tag gostava de sua vida. Ele sempre achou que seus pais podiam ter feito um trabalho melhor com o seu nome, mas isso era okay. Ele achava que a sua rotina fixa era confortável. E, tirando aquele negócio do peixe, Tag achava que era uma pessoa muito normal.
Ele não era.
Mas realmente achava que era.
Em um lindo dia, Tag chegou em casa as 6:18 pm, como normalmente chegava. Encontrou Hamster deitado de barriga para cima perto de sua rodinha, como normalmente encontrava. Ele tinha tido um dia normal. Tudo estava normal. Por isso Tag sentou em seu sofá e chorou. Como normalmente fazia.
Tag queria que tudo fosse perfeito, mas normal era o máximo que conseguia. Então ele chorava todos os dias. Mas ele era "feliz, deprimido não!", porque chorar sozinho no escuro todo santo dia, entre 6:20 e 6:24 pm, sentado ao lado de seu gato com problemas de identidade chamado Hamster, era comum. Não alcançar perfeição era comum também, e se era comum, Tag estava feliz.
Mas naquele dia, algo tinha mudado. Tudo estava normal e ele tinha acabado de chorar, então Tag percebeu que não queria mais aquilo. Tag queria mudar, e estava pronto para isso.
"Sem mais normalidades!"
No dia seguinte, Tag acordou cedo e foi para a loja de animais. Foi uma caminhada corajosa feita por um homem corajoso! O vento frio passando através de suas roupas, suas mãos congelando dentro dos bolsos de sua jaqueta, seu lábio inferior ficando roxo por causa do frio. E o sol mais quente da história nas suas costas. Tag exagerava bastante quando sob pressão. " É só comprar a comida do Hamster, olhar para um peixe ou dois, não desmaiar e ir trabalhar. Só isso! Eu consigo fazer isso." Ele sabia que podia fazer isso - mesmo achando que não podia. Ele achava que tinha o poder.
Ele entrou na loja como alguém normal - e esse era bom - pegou uma lata de comida de gato e caminhou até a "Parede de Aquários". A "Parede de Aquários" era completamente coberta com todos os tipos de aquários, com todos os tipos de peixes dentro deles. A mão de Tag suava, sua testa estava molhada, mas ele sabia que ele podia!
Ele parou na frente da "Parede de Aquários" com seus olhos fechados. Respirou fundo, contou até cinco, jurou para si mesmo que podia e abriu os olhos.
Tag não gostou do que viu. Ele pensou que sempre soube que nunca poderia fazer aquilo. Sua garganta fechou e a sua cara ficou vermelha. Ele não conseguia respirar, mas não ia fechar os olhos. Ele achou que talvez pudesse ter o poder para fazer aquilo. Afinal, por que não?
Tag contou até trinta com os seus olhos arregalados encarando a "Parede de Aquários", pagou pela comida do Hamster e foi para casa.
Aquela foi uma boa caminhada! O sol brilhava, as crianças brincavam! E ele tinha acabado de fazer aquilo. Agora Tag sabia que nunca teve dúvidas sobre a sua capacidade de fazer algo daquele tipo!
Agora ia para casa, dar a comida para o Hamster, ir até o seu trabalho e dizer para a sua chefe que ela era ridícula. E então ele ia se demitir, e.. e.. e ir até "um daqueles lugares nojentos onde as pessoas vão para beber - ou inalar - substâncias alcoólicas e pegar infecções por causa do pote de amendoim comunitário."
Tag não se demitiu, ou chamou a sua chefe de ridícula, pois seriam "muitas atitudes corajosas no mesmo dia". Mas ele pegou um infecção por causa do pote de amendoim comunitário.
Tag era um cara mudado.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

"Quando alguém pergunta a um autor o que este quis dizer, é porque um deles é burro"
Mário Quintana